Marcado: logan

velho de guerra

logan (eua, 2017) ★★★☆☆

a saga de mutantes guerreiros é, por si só, um vasto terreno para explorar metáforas que se desdobram em camadas de histórias cheias de apelo e significado. desde que surgiu, a franquia de filmes dos x-men ajudou a moldar a estrutura narrativa dos super-heróis no cinema, com aventuras visualmente deslumbrantes embrulhando um contexto mais denso – o discurso deles, pode notar, alternava entre preconceito, exclusão, autoaceitação, empoderamento e… wolverine.

num mundo tão rico de personagens únicos, suas origens misteriosas e superpoderes raros, vale analisar por que apenas um ganhou destaque – e três filmes solo. wolverine encarna o arquétipo americano do herói moderno: solitário, lacônico, sombrio, marrento. aquele feito sob medida para andar em câmera lenta enquanto uma explosão destrói a paisagem ao fundo. mata o inimigo e faz uma piadinha. não se importa com ninguém. bebe sua bud no gargalo. conquista mulheres e faz uma piadinha. anda de moto. fuma charuto. cospe no chão e faz uma piadinha.

nos quadrinhos, wolverine caiu como uma luva no sonho de vida de todos aqueles nerds mirrados. adaptado pro cinema, ele ainda ganhou o carisma de hugh jackman. aí deu no que deu: o rambo do novo milênio agora tinha garras de adamantium. o que, claro, não representa a priori nenhum problema. cada um tem o herói que quer. ruim mesmo é quando o roteiro precisa simular uma profundidade onde só tem beirada, aí transforma o filme no festival da fita crepe.

não que a galera não se esforce! assim como o protagonista dá a logan, patrick stewart confere ao professor xavier uma dimensão nunca experimentada em qualquer título da saga. visivelmente mais velhos, ambos apresentam uma fadiga extrema, fruto de anos de lutas constantes, e uma certa comiseração mútua. quem rouba a cena, contudo, é a novata dafne keen. espécie de mini-rooney mara, ela encarna uma jovem mutante que não conhece o medo. a fotografia é conservadora, como nos clássicos, e o som também merece atenção: provavelmente, é o mais silencioso de todos os filmes dos x-men.

mas aí vem a festa da gambiarra. no esforço de aprofundar e trazer relevância ao personagem principal, o roteiro apela para nossa senhora soluções milagrosas, deixando várias pontas soltas. pensa bem: embora tenha enfrentado sozinha inúmeros capangas, por que laura, na companhia dos amigos, fugiu com medo de lutar contra o mesmo número de vilões depois? como aquela mulher conseguiu editar e locutar o vídeo no celular enquanto fugia com a menina? se não podia tomar todo o remédio verde, como logan faz isso e nada lhe acontece? e as coordenadas oriundas de uma revista em quadrinhos, alguém explica? além disso, numa realidade na qual supostamente já foi inventada a “cura” para o gene x (x-men: o confronto final), qual o sentido de matar crianças mutantes que não serviriam para lutar? melhor tirar seus poderes e vendê-las pra zara, não?

logan ainda esboça algumas analogias “sérias” para dar peso à história. além de forçar a barra para inserir um trecho de os brutos também amam, que é lembrado posteriormente num momento meio vergonha alheia, traz também um clone mais jovem do wolverine entre o séquito de inimigos. aquela coisa de enfrentar o passado, vencer você mesmo e parará… o que não condiz com a realidade, pois o personagem apenas se repete desde que foi apresentado, oscilando entre o desejo de seguir sozinho e o de proteger quem gosta. definitivamente, o arco dramático mais reto já visto em hollywood.